O eleitor consegue votar direito?

É muito comum ouvir/ler coisas como “você tem que votar direito” ou “a culpa é de quem elege”. Esse tipo de afirmação parte de uma premissa oculta: a de que é possível avaliar, em bases racionais, cada voto.

O eleitor consegue votar direito?

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É muito comum ouvir/ler coisas como “você tem que votar direito” ou “a culpa é de quem elege”. Esse tipo de afirmação parte de uma premissa oculta: a de que é possível avaliar, em bases racionais, cada voto.

Não obstante a proliferação de aplicativos, sites e outros instrumentos que permitem uma visão geral do histórico de candidatos (sobretudo aqueles que já ocupam ou ocuparam cargos políticos), há muitas opções. Só no ano de 2018, quase 30 mil candidaturas foram registradas no TSE aos cargos eletivos de: Presidente da República, Governador de Estado/Distrito Federal, Senador, Deputado Federal, Deputado Estadual/Distrital. Foram 13 candidaturas só para a Presidência da República.

Mesmo que o eleitor seja domiciliado em uma unidade federativa com um colégio eleitoral pequeno, o número de candidatos à sua escolha ultrapassa mil opções: e quem vai avaliar mais de mil pessoas/propostas/promessas?

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Ainda que alguém se disponha a escolher o candidato pelas propostas do partido político — o que, em regra, não é um método eficiente — são 35 perfis (partidos) diferentes: milhares de páginas de leitura, uma verdadeira pesquisa acadêmica. E, ainda por cima, nada garante que o candidato seguirá os ditames do partido.

Seria possível até argumentar: “se não dá para conhecer todos os candidatos, conheça pelo menos os seus”. E quem disse que os eleitores, na média, têm acesso às ferramentas que permitem tal conhecimento? Mesmo em tempos de “acesso à informação” é razoável supor que Dona Maria vai deixar de lado seu programa de culinária ou Seu João vai deixar de assistir ao futebol para gastar seu pacote de dados pesquisando sobre determinado candidato? E, se o fizer, será que vai compreender as propostas? E se for a primeira candidatura e não houver “passado político” do candidato? E se o candidato tiver pouco tempo de televisão? E é possível examinar coisas como honestidade a partir daquelas informações?

Some-se a isso o fato de que a população votante, na média, não tem o menor interesse pela política, pela leitura, pela análise percuciente… e dificilmente sabe diferenciar as funções de um Deputado Estadual das de um Senador (o que também se pode dizer de muitos candidatos). Aliás, quase 60% dos brasileiros sequer iria às urnas se o voto não fosse obrigatório e cerca de 80% não consegue lembrar em quem votou na última eleição.

Embora os cargos para o Executivo (Presidente/Governador) sofram um escrutínio maior, a comunidade jurídica tem pleno conhecimento do peso do Legislativo na boa ou na má gestão.

Fato: o sistema político precisa de mudança! A lotérica aleatoriedade eleitoral não pode ser jogada nas costas do eleitor. Precisamos de menos partidos, menos candidatos e menos cargos. A subdivisão do Estado brasileiro em três níveis sobrepostos de governo (federal, estadual e municipal) é caótica: as manifestações de 2013 indicaram, por meio das mais variadas reivindicações (desde o passe livre até o fim da corrupção, passando por pedidos de emprego, educação e saúde), que não é possível à população indicar responsabilidades. Atear fogo aos ônibus, em protesto ao transporte, indica que a secretaria de transportes fica protegida das reivindicações e do eficiente cumprimento de suas incumbências.

A culpa não é do eleitor. E a comunidade jurídica precisa se engajar em difundir o conhecimento acerca desses problemas!

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