O Procedimento Comum no Novo CPC: Audiência de Conciliação ou de Mediação – 5ª Parte.
Veja também:
- O Procedimento Comum no Novo CPC: Providências Iniciais do Juiz – 4ª Parte.
- O Procedimento Comum no Novo CPC: Defesa do Réu – 6ª Parte.
A audiência de conciliação ou de mediação (ACM) é o ato processual por meio do qual o Poder Judiciário tenta encerrar o litígio, estimulando que as próprias partes entrem em acordo a respeito da solução do problema estabelecido entre elas.
O réu, em regra, é citado para comparecer à ACM. A audiência será de conciliação quando as partes não tiverem vínculo anterior entre si, sendo que, neste caso, o conciliador poderá sugerir soluções para o problema (§2º do art. 165 do Novo CPC).
Por outro lado, a audiência será de mediação quando as partes já tiverem entre si vínculo jurídico preestabelecido, caso em que o mediador deverá estimular que as próprias partes encontrem uma solução consensual para o litígio (§3º do art. 165 do Novo CPC). Exatamente por esses motivos, a audiência será de conciliação ou de mediação. A literatura jurídica também atribui outros nomes à audiência de conciliação ou de mediação: inaugural, inicial ou preliminar.
A ausência de qualquer das partes à ACM constitui “ato atentatório à dignidade da justiça”. A parte que se ausentar à ACM será sancionada com multa de até dois por cento do valor da causa ou da vantagem econômica pretendida (§8º do art. 334 do Novo CPC). O comparecimento à ACM não precisa ser pessoal: as partes podem comparecer por meio de terceira pessoa — um representante, com poderes (procuração) para negociar (§10 do art. 334 do Novo CPC). Além disso, a audiência pode ser realizada por meio eletrônico (a exemplo da videoconferência), não dependendo da presença física dos envolvidos (§7º do art. 334 do Novo CPC). De qualquer forma, as partes, pessoalmente, ou seus procuradores, devem estar acompanhadas dos seus respectivos advogados (§9º do art. 334 do Novo CPC).
Não haverá ACM se ambas as partes declararem expressamente que não se interessam pelo acordo (§4º, I, do art. 334 do Novo CPC). Nesta hipótese, o CPC diz que o autor “deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse” e o réu deverá informar seu desinteresse pelo acordo com pelo menos dez dias de antecedência da data da audiência (§5º do art. 334 do Novo CPC).
Ocorre que, mesmo que o autor não tenha declarado na petição inicial (silenciando a respeito), se o réu peticionar expressando seu desinteresse pelo acordo, o autor também poderá, por petição simples, antes da audiência, informar que não se interessa pelo ato: neste caso, pela instrumentalidade das formas (art. 277 do CPC), o juiz também não deve designar data para a audiência, porque, embora o CPC diga que o desinteresse do autor deve constar da petição inicial, se ambas as partes manifestaram expressamente sua oposição ao acordo, entende-se que a audiência restaria infrutífera (e, portanto, desnecessária)[1]. Se só uma das partes manifestar seu desinteresse pela audiência, o juiz, ainda assim, terá de designar data para a ACM e, mesmo aquele que manifestou seu desinteresse terá de comparecer, sob pena de ser sancionado pela ausência. Tanto é assim que, quando houver litisconsórcio (pluralidade de autores e/ou réus), todos devem manifestar expressamente seu desinteresse, caso contrário, a audiência será realizada (§6º do art. 334 do Novo CPC).
Também não haverá audiência quando não se admitir transação (§4º, II, do art. 334 do Novo CPC). Embora o Novo CPC fale que a audiência não será designada “quando não se admitir a autocomposição”, entende-se que o vocábulo mais adequado seja transação. É que a autocomposição é uma categoria jurídica de gênero, da qual são espécies (i) a renúncia ao direito, (ii) o reconhecimento da procedência (chamadas de submissão, porque uma parte se submete inteiramente ao desejo da outra) e (iii) a transação (caso em que cada parte abre mão de parcela que lhe cabe, conforme determina o art. 840 do Código Civil).Sendo assim, se o autor ajuíza uma ação requerendo o estabelecimento de pensão alimentícia, o direito aos alimentos é irrenunciável, logo, como a renúncia é uma das espécies de autocomposição, o juiz não poderia designar data para ACM.
Ocorre que o valor da pensão pode ser objeto de transação (pode ser que o autor esteja pedindo três mil, e o réu sugira mil: ambas as partes transacionam e chegam ao valor de dois mil). Se o CPC fosse seguido na sua literalidade, como o direito aos alimentos não pode ser renunciado, a ACM não deveria ser designada. Mas, aqui, deve-se compreender que havendo possibilidade de transação, a ACM deve ser designada. Logo, tecnicamente, deve-se compreender que o inciso II do §4º do art. 334 do Novo CPC está se referindo a uma única espécie de autocomposição, que é a transação, e, portanto, a ACM deve, sim, ser designada sempre que as partes puderem realizar a transação acerca do direito debatido (como no caso do valor da pensão)[2]. Só não deve haver audiência naquelas hipóteses em que as partes realmente não puderem transacionar: como no caso de uma ação de reconhecimento de paternidade, na qual não é possível que as partes transacionem para que seja reconhecido apenas determinado porcentual da paternidade.
Por outro lado, para aqueles casos em que a Fazenda Pública for parte (autora/ré), o Novo CPC previu a criação de “câmaras de mediação e de conciliação” (art. 174 do Novo CPC), permitindo a transação que envolva o interesse das Unidades Federativas (União, Estados, Distrito Federal, Municípios) e suas respectivas autarquias e fundações. É que, em regra, quando o interesse público estiver envolvido, os advogados públicos, que representam a Fazenda Pública, não podem transacionar, salvo raríssimas exceções[3].
Ocorre que, enquanto não forem criadas as câmaras de mediação e de conciliação, voltadas ao interesse desses entes federativos, as causas que envolverem a Fazenda Pública, em regra, também não deverão comportar a realização da ACM, já que o advogado público não poderá transacionar. Nesses casos, a ACM só será marcada naquelas raríssimas exceções em que se permite expressamente que o advogado público transacione[4].
Por fim, é preciso dizer que, se as partes transacionarem na ACM, o juiz proferirá sentença, homologando o acordo (§11 do art. 334 do Novo CPC), extinguindo o processo com resolução de mérito (art. 487, III, b, Novo CPC). Ao contrário, se não houver acordo, começará a fluir o prazo para que o réu apresente sua defesa (art. 315, I, Novo CPC).
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[1] A instrumentalidade serve aqui para evitar que a excessiva formalidade acabe por tornar o processo mais demorado (menos célere) do que deveria (com duração desarrazoada). Se o autor, mesmo não sendo na petição inicial (arts. 319, VII, e 334, §5º, CPC), consegue informar ao juiz seu desinteresse pelo acordo — depois de o réu já ter se expressado no mesmo sentido —, deve-se entender que o ato de informar cumpriu sua finalidade, mesmo que a forma (petição inicial) não tenha sido estritamente observada. Verificada, então, essa convergência das partes no sentido da objeção ao acordo, a designação da audiência representaria um atraso desarrazoado à marcha processual (porque já seria previsível sua inutilidade): daí não se exigir que a formalidade de o autor fazer o pedido na petição inicial seja obrigatoriamente seguida, podendo haver flexibilização dessa forma em prol da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF e arts. 1º e 4º do CPC).
[2] Nesse sentido, o Código de Processo Civil anterior (Lei 5.869/73) era mais técnico ao falar expressamente em transação, mas pecava porque dizia que a audiência não seria designada “se o direito em litígio” não admitisse transação (art. 331, §3º, do CPC/73, com a redação da Lei 10.444/02). Isso gerava o mesmo problema do CPC atual: se a ação fosse de alimentos, o direito, em si, aos alimentos não admitiria transação. Mas, desde a redação anterior já se compreendia que a audiência deveria ocorrer se o valor da pensão pudesse ser transacionado. A atecnia permanece na redação do CPC atual e também permanece o entendimento de que a ACM deve ser designada quando houver possibilidade de transação.
[3] No rito comum, uma exceção é a Portaria 109/07, arts. 3º e 5º, da Advocacia Geral da União (AGU). Mas, nas causas sujeitas aos procedimentos dos juizados especiais federais e da fazenda pública, há previsão para que os advogados públicos transacionem (art. 10, parágrafo único, da Lei 10.259/01 e art. 8º da Lei 12.153/09, combinados com os arts. 2º, 3º e 5º da Portaria 109/07 da AGU).
[4] Além da Portaria 109/07 da AGU, as procuradorias dos Municípios, dos Estados e do Distrito Federal poderão transacionar quando houver leis ou atos normativos (portarias, resoluções, instruções normativas etc.) que os autorizem, já que o princípio da legalidade (art. 37, caput, CF) não permite a transação por advogados públicos sem autorização prévia.
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